Câncer de bexiga: nova abordagem terapêutica reduz em 32% a probabilidade de recidiva
EDUCAÇÃOSAÚDE

Câncer de bexiga: nova abordagem terapêutica reduz em 32% a probabilidade de recidiva

Um estudo inovador, divulgado pela primeira vez, demonstra que a imunoterapia injetável pode atenuar o risco de recidiva do câncer de bexiga quando utilizada em conjunto com a quimioterapia pós-cirurgia de remoção da bexiga. A pesquisa, publicada na respeitável The New England Journal of Medicine, foi apresentada no último domingo (15) no Congresso Europeu de Oncologia, realizado em Barcelona, Espanha.

Intitulado NIAGARA, o estudo revelou que a adição de Durvalumabe, uma imunoterapia injetável, ao regime terapêutico aumentou em 34% a probabilidade de resposta patológica completa, significando a total erradicação do tumor observado microscopicamente após a cirurgia. Essa abordagem resulta em uma diminuição de 32% na probabilidade de recidiva do câncer após a conclusão do tratamento.

“Os resultados alcançados por este estudo são significativos e podem propiciar uma transformação no tratamento de pacientes com câncer de bexiga, promovendo a possibilidade de cura e melhoria na qualidade de vida”, assevera Ariel Kann, coordenador do Centro Especializado em Oncologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e coautor da pesquisa.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a American Cancer Society, 614 mil indivíduos são diagnosticados anualmente com câncer de bexiga, configurando-se como o nono tipo mais prevalente. A enfermidade é quatro vezes mais comum em homens do que em mulheres, com o tabagismo sendo o principal fator de risco, além da exposição ocupacional a substâncias químicas.

O sintoma mais proeminente do câncer de bexiga é a hematuria, frequentemente acompanhada de dor pélvica e ardência ao urinar. O diagnóstico é realizado por meio de exames de imagem (ultrassom, tomografia ou ressonância) e cistoscopia, que consiste na inserção de um dispositivo com câmera na uretra para inspeção da bexiga e coleta de amostras para biópsia.

 

Inclusão da imunoterapia pode ampliar a expectativa de vida dos pacientes

Conforme elucidado por Bruno Benigno, urologista e oncologista do Hospital Oswaldo Cruz e diretor da Clínica Uro Onco, existem dois perfis de pacientes com câncer de bexiga. “Há aqueles com tumor superficial, que acomete apenas a mucosa do órgão, sem infiltração na camada muscular mais profunda. Por outro lado, há os que apresentam infiltração muscular, o que estabelece um contato direto com a vascularização, elevando a probabilidade de metástase”, esclarece o especialista.

Atualmente, o tratamento é orientado pelo estágio da doença, podendo abranger desde a remoção parcial da bexiga (cistectomia parcial) até a remoção total do órgão (cistectomia radical), sendo esta última recomendada para tumores de maior profundidade. Pesquisas anteriores demonstraram que a realização de quimioterapia pré-operatória pode incrementar a expectativa de cura em 7% a 15%, consolidando-se como a abordagem padrão para casos avançados de câncer de bexiga.

Embora o tratamento vigente apresente eficácia, a recidiva da doença e a expectativa de vida ainda impõem desafios significativos, conforme salienta Benigno. A incorporação da imunoterapia na abordagem terapêutica, proposta pelo recente estudo, pode contribuir para reverter esse panorama, oferecendo uma solução mais robusta para a sobrevida de pacientes com câncer de bexiga.

“O que torna este estudo inovador é a disponibilização de uma medicação que favorece o aumento das taxas de cura e a expectativa de sobrevivência. Esse é o avanço”, observa Benigno, que não participou da pesquisa.

 

Como o estudo foi conduzido?

Para chegar a suas conclusões, o estudo incluiu 1.063 pacientes com câncer de bexiga que necessitavam de cirurgia. Os participantes foram divididos em dois grupos: um recebendo a quimioterapia convencional, com os fármacos Cisplatina e Gemcitabina, e o outro recebendo a quimioterapia em combinação com a imunoterapia Durvalumabe, tanto antes quanto após a cirurgia.

“A imunoterapia atua estimulando o sistema imunológico a reconhecer as células tumorais como elementos hostis. Assim, o organismo passa a atacar essas células malignas”, esclarece Kann. Os participantes receberam quimioterapia com ou sem imunoterapia e, subsequentemente, foram submetidos à cirurgia. Aqueles que passaram pelo tratamento com imunoterapia apresentaram uma probabilidade reduzida de recidiva tumoral.

A nova abordagem terapêutica proposta é recomendada para pacientes com câncer de bexiga localizado, ou seja, que ainda não apresentaram metástase, conforme afirma Kann.

 

Próximos passos para o tratamento do câncer de bexiga

Na perspectiva do coautor do estudo, a descoberta tem o potencial de transformar a prática clínica para pacientes com câncer de bexiga. Contudo, para que isso se concretize, os resultados ainda necessitam ser submetidos às agências reguladoras, como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no Brasil. “É apenas uma questão de tempo”, afirma Kann.

Entretanto, segundo Benigno, o estudo apresenta algumas limitações, especialmente no contexto brasileiro. “Essa imunoterapia é uma medicação extremamente dispendiosa, administrada em aproximadamente oito ciclos, e está longe de ser incorporada ao sistema público de saúde. Assim, um dos grandes desafios é viabilizar seu acesso para um número maior de pacientes”, analisa o urologista.

Outro desafio reside na identificação do desaparecimento do tumor antes da cirurgia de remoção da bexiga. “No estudo, aproximadamente 20 a 25% dos pacientes que receberam o tratamento com quimioterapia e imunoterapia não apresentavam mais o tumor no momento da cirurgia, o que indica uma resposta completa. Contudo, o grande desafio é como verificar essa completa erradicação tumoral antes da ressecção da bexiga”, comenta Benigno.

Essa identificação prévia — que, segundo o especialista, poderia ser viabilizada pelo desenvolvimento de marcadores sanguíneos ou urinários — asseguraria ao cirurgião que houve regressão total do tumor, aumentando as chances de preservação da bexiga no paciente. “Ainda não dispomos desse marcador, e creio que essa será a direção dos próximos estudos”, afirma.

De acordo com Kann, esse é o futuro almejado pelos pesquisadores. “O próximo passo é aproveitar os achados deste estudo para determinar quais pacientes necessitam de todas as doses e quais requerem aumento dos ciclos de medicação. O estudo também investiga o DNA tumoral circulante. Ademais, estamos avaliando a qualidade de vida dos pacientes, com a ambição de, quem sabe, tratar sem a necessidade de cirurgia da bexiga. Esse seria o cenário ideal”, declara.

Qual Sua Reação?

Alegre
0
Feliz
0
Amando
0
Normal
0
Triste
0

You may also like

More in:EDUCAÇÃO

Leave a reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *